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A Cia. Mecenato Moderno leva a memória da Comissão da Verdade aos palcos com a peça Prontuário 12.528

Foto do escritor: Pedro CantelliPedro Cantelli

A peça aborda temas como colonização exploratória, genocídio indígena, machismo, racismo e autoritarismo, misturando depoimentos e referências históricas

Imagem: João Caldas Fo

A Cia. Mecenato Moderno traz aos palcos do Teatro do Núcleo Experimental o espetáculo Prontuário 12.528, uma montagem inovadora que se inspira nos depoimentos colhidos pela Comissão Nacional da Verdade e em textos históricos para contar uma versão profunda e crítica da história do Brasil. A estreia acontece em um contexto de constante debate sobre o direito à memória e à verdade, temas centrais da peça.


Com dramaturgia, trilha sonora e direção de Cesar Ribeiro, a obra mistura relatos históricos de diferentes períodos do país, conectando-os de forma inovadora através da linguagem visual de quadrinhos e desenhos animados. O resultado é uma combinação impactante de história, política e arte, representada por pacientes de um hospital em ruínas que funcionam como narradores dessas memórias.


A peça percorre a complexa trajetória da colonização brasileira, abordando como a violência colonial impactou diferentes camadas sociais, desde o genocídio indígena até a imposição do machismo e do racismo estrutural, que reverberam até os dias de hoje. Textos de figuras históricas como Pero Vaz de Caminha e Yves d’Évreux são utilizados para criar diálogos provocativos com os depoimentos contemporâneos das comissões da verdade, estabelecendo um ponto de encontro entre passado e presente.


O que destaca Prontuário 12.528 de outras obras que exploram o contexto histórico do Brasil é sua abordagem visual. A peça utiliza referências estilísticas de quadrinhos e animações para dar vida aos relatos, contrastando o peso das questões abordadas com um visual que dialoga com diferentes gerações de espectadores. A cenografia de J. C. Serroni e os figurinos de Telumi Hellen ajudam a criar esse universo único, enquanto a iluminação de Domingos Quintiliano estabelece atmosferas que reforçam as tensões dramáticas.


A montagem traz ao palco um elenco talentoso composto por Clara Carvalho, Helio Cicero, Mariana Muniz e Pedro Conrado, que dão voz e corpo a personagens que oscilam entre a ficção e a realidade histórica. Esses personagens, pacientes de um hospital em ruínas, relatam suas experiências, que simbolizam a trajetória de um Brasil que enfrenta seus fantasmas, buscando justiça, memória e reparação para os horrores cometidos.


Essa narrativa múltipla permite que o público reflita sobre como as estruturas de autoritarismo e opressão não desapareceram com o fim da ditadura militar, mas seguem sendo reconfiguradas ao longo da história. A peça convida a uma reflexão sobre as marcas deixadas na sociedade brasileira pela violência de Estado e pelo apagamento de memórias.


Prontuário 12.528 é, em essência, uma peça sobre a luta por memória e verdade. Ao reunir relatos históricos e contemporâneos, a peça reafirma a importância de revisitar o passado para entender as mazelas do presente. A Cia. Mecenato Moderno oferece uma obra que não apenas busca revisitar os momentos sombrios da história brasileira, mas que, ao fazê-lo, também questiona como essas estruturas de poder continuam a moldar a realidade do país.


O público é desafiado a refletir sobre as cicatrizes deixadas pela colonização exploratória, pela violência contra populações indígenas, pelo machismo, o racismo, e o legado do autoritarismo que ainda ecoa em várias esferas da sociedade brasileira.

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