Otto Lara Resende ou Bonitinha, mas ordinária ou no Brasil todo mundo é Peixoto volta em curta temporada no Teatro Núcleo Experimental
- Isabel Branquinha
- há 2 horas
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Com direção de Nelson Baskerville, montagem transforma a tragédia de Nelson Rodrigues em uma distopia sobre o moralismo e as contradições do Brasil contemporâneo

O premiado diretor Nelson Baskerville revisita uma das mais emblemáticas tragédias de Nelson Rodrigues (1912–1980) para criar um retrato brutal e distorcido das hipocrisias brasileiras. O espetáculo Otto Lara Resende ou Bonitinha, mas ordinária ou no Brasil todo mundo é Peixoto retorna aos palcos em uma curta temporada a partir de 6 de novembro de 2025, no Teatro Núcleo Experimental, em São Paulo.
A montagem parte do texto original para construir uma distopia urbana, onde moralidade e miséria se misturam sob o verniz da aparência — e onde o avanço da extrema direita expõe os mesmos valores hipócritas que Rodrigues já denunciava há mais de meio século.
Uma tragédia brasileira em chave distópica
No centro da narrativa está Edgard, um homem honesto, mas oprimido pela pobreza e pela culpa. Após anos de trabalho submisso, ele recebe do patrão Werneck uma proposta tentadora: casar-se com Maria Cecília, uma jovem rica e “bonitinha”, mas envolta em um passado controverso. A partir daí, o personagem se vê dilacerado entre dinheiro e moralidade, desejo e ética, sobrevivência e vergonha — dilemas que ganham contornos sombrios e atuais sob o olhar de Baskerville.
O cenário, feito de pneus e borracha, cria uma atmosfera sufocante que simboliza o peso da degradação social e ambiental. Em cena, figuras mascaradas com sacolas plásticas de supermercado e figurinos manchados de lama compõem a iconografia de um país onde a sujeira é, ao mesmo tempo, literal e moral.
A sociedade do disfarce
Com humor ácido e olhar político, a encenação transforma o texto rodriguiano em alegoria da sociedade brasileira, marcada pela desigualdade, pelo moralismo religioso e pelo autoritarismo que se infiltra sob o discurso da decência. Baskerville atualiza a tragédia para o nosso tempo, expondo as máscaras sociais que sustentam um país que “tudo perdoa, desde que não se veja”.
“Nelson Rodrigues sempre escreveu sobre o abismo entre o que o Brasil diz ser e o que ele realmente é. Essa peça é o espelho desse abismo — e hoje ele está mais fundo do que nunca”, comenta o diretor.
Trilha sonora ao vivo e elenco numeroso
A trilha sonora, executada ao vivo, mistura a força melancólica de Astor Piazzolla (Vuelvo al Sur e Adios Nonino) com músicas populares brasileiras de Roberto Carlos e José Augusto, criando um contraste entre lirismo e banalidade — entre o sublime e o kitsch.
O elenco reúne 19 intérpretes, entre eles Afonso Bispo Jr, Alexandre Mahgno de Castro, Carol Rainatto, Davi Parizotti, Duda Paiva, Filipe Barral, Isa Scoralick, Júlia Castanheiro, Juliana Roberta, Lauro Fagundes, Leonardo Van der Neut, Luciana Marcon, Lia Bennatti, Marcio Araujo, Maria Estela Modena, Naiara de Castro, Nelson Fioque, Sabrina Larisse e Thayse Vecchi.
Sobre Nelson Baskerville
Nelson Baskerville, nascido em Santos em 1961, é ator, diretor, dramaturgo e artista plástico. Recebeu os principais prêmios da cena teatral brasileira, entre eles o Shell 2011 de Melhor Direção por Luis Antonio – Gabriela, o APCA 2011, o Prêmio Governador do Estado (júri popular) e o CPT de Melhor Diretor e Conjunto da Obra.
Foi indicado ao Prêmio Shell em diversas ocasiões, incluindo Eigengrau (2017), As Estrelas Cadentes do Meu Céu são Feitas de Bombas do Inimigo (2013) e Os 3 Mundos (2018). Fundador da AntiKatártiKa Teatral (AKK), é reconhecido por seu teatro político, plástico e visceral — uma fusão entre poesia, ruína e crítica social.
Além do teatro, participou de séries e novelas como Maysa, Viver a Vida, O Negócio (HBO), Carcereiros, Onde Está Meu Coração, Coisa Mais Linda e Sintonia, além dos filmes Doutor Gama, Papai é Pop e Madame Durocher.
Sinopse
Em uma sociedade corroída pelo moralismo e pela ganância, Edgard, um homem simples e miserável, recebe uma proposta que pode mudar sua vida: casar-se com Maria Cecília, jovem rica e “bonitinha”, mas com um passado comprometedor. Diante do dilema entre dinheiro e ética, ele mergulha em um universo de desejos reprimidos, traições e hipocrisias. A tragédia rodriguiana, recriada por Nelson Baskerville como uma distopia contemporânea, revela o Brasil como ele é: ordinário, sedutor e corrompido — onde, afinal, “no Brasil todo mundo é Peixoto”.
Serviço
Espetáculo: Otto Lara Resende ou Bonitinha, mas ordinária ou no Brasil todo mundo é Peixoto
Texto e direção: Nelson Baskerville
Elenco: Afonso Bispo Jr, Alexandre Mahgno de Castro, Carol Rainatto, Davi Parizotti, Duda Paiva, Filipe Barral, Isa Scoralick, Júlia Castanheiro, Juliana Roberta, Lauro Fagundes, Leonardo Van der Neut, Luciana Marcon, Lia Bennatti, Marcio Araujo, Maria Estela Modena, Naiara de Castro, Nelson Fioque, Sabrina Larisse e Thayse Vecchi
Local: Teatro Núcleo Experimental – Rua Barra Funda, 637, São Paulo/SP
Temporada: 6 a 27 de novembro de 2025
Horário: Quintas-feiras, às 20h30
Ingressos: R$60 (inteira) | R$30 (meia-entrada)
Gênero: Drama
Classificação indicativa: 18 anos
Duração: 110 minutos
Instagram: @bonitinhamasordinariasp





