Antígona Travesti, de Renata Carvalho, transforma o teatro em célula de resistência
- Isabel Branquinha

- há 2 horas
- 3 min de leitura
Espetáculo ocupa diferentes espaços da cidade e convida o público a encontros secretos para derrubar Creonte

Até 30 de novembro de 2025, o teatro se tornará trincheira e ritual de resistência. É nesse espírito que a atriz, diretora, dramaturga e transpóloga Renata Carvalho apresenta Antígona Travesti, seu novo espetáculo — uma reinterpretação contemporânea e visceral da tragédia de Sófocles, atravessada pela realidade das travestis e mulheres trans no Brasil.
A montagem, concebida como uma reunião secreta contra a tirania, acontece em locais que mudam a cada encontro, incluindo Vila Maria Zélia, Teatro Taib, Casa 1, Teatro de Arena Eugênio Kusnet e a Ocupação Nove de Julho. Os interessados em participar precisam escrever diretamente para Antígona pelo WhatsApp +55 11 94067-3441 — somente assim recebem as coordenadas exatas de data, horário e local.
Um levante travesti contra o poder
Na megalópole distópica de Tebas, Creonte acaba de consolidar um golpe de Estado. Entre os escombros desse novo regime religioso e autoritário, Antígona — agora travesti e líder comunitária — dirige uma ONG dedicada ao acolhimento de pessoas trans.
A tragédia começa quando sua filha Polinice, uma travesti de 23 anos, é brutalmente assassinada. O tirano decreta que o corpo não poderá ser enterrado com roupas femininas, negando inclusive o nome da jovem na lápide. Inconformada, Antígona convoca suas irmãs de luta — as travestis e mulheres trans de Tebas — para um levante secreto que desafia o poder e exige dignidade.
“Antígona Travesti é sobre reconstruir o olhar coletivo sobre a experiência trans. É uma narrativa de afeto, de resistência e de amor traviarcal”, explica Renata Carvalho.
Um coro travesti em cena
A montagem é conduzida por Renata Carvalho no papel-título, acompanhada por um Coro Travesti formado por Alice Guél, Andreas Mendes, Ave Terrena, Ayo Tupinambá, Daniela D’eon, Maria Lucas e Thays Villar. Juntas, elas constroem uma dramaturgia coral e insurgente, que transforma o palco em espaço político e espiritual de enfrentamento.
As referências vão de Sófocles a Camila Sosa Villada (O Parque das Irmãs Magníficas), passando por Chico Buarque e Paulo Pontes (Gota d’Água), Alana S. Portero (Mau Hábito), e por fatos reais da história recente — como a Operação Tarântula (1987), que perseguiu e assassinou travestis em São Paulo, e o assassinato de Qelly da Silva, em Campinas.
Apesar de abordar a violência, a encenação opta por um tom afirmativo: Antígona é uma traviarca protetora e afetuosa, símbolo de um outro modo de existir e cuidar.
Estética da resistência
Visualmente, Antígona Travesti recria o ambiente de uma reunião clandestina durante a ditadura militar, com luz branca e amarela e trilha enxuta, composta por apenas uma música de tom celestial. A encenação se apoia na presença, na palavra e na cumplicidade com o público, rompendo a fronteira entre teatro e manifesto.
O espetáculo nasceu de um convite da atriz Leila Pereira Daianis, ativista e presidente da Associação Libellula, na Itália, dedicada ao apoio de mulheres, imigrantes e pessoas trans. A primeira leitura dramática da peça ocorreu em Roma, em dezembro de 2024, com as participações de Barbara Rodrigues, Mel Campos, Raissa Dubrahalém, além de Leila e da própria Renata.
Renata Carvalho: arte, corpo e transpologia
Atriz, diretora, dramaturga e transpóloga, Renata Carvalho é uma das vozes mais influentes do teatro contemporâneo. Fundadora do MONART – Movimento Nacional de Artistas Trans e autora do Manifesto Representatividade Trans, atua pela inclusão de corpos travestis e trans nos espaços de criação e denuncia o trans fake — prática em que artistas cis interpretam personagens trans.
Desde 2007, Renata desenvolve sua transpologia, um campo de estudo sobre a construção social, midiática e religiosa dos corpos trans/travestis. Seu corpo é, ao mesmo tempo, objeto e sujeito de pesquisa, usado para expor as ausências, as violências e as potências que atravessam a existência travesti.
Sinopse
Após o golpe de Estado de Creonte, Tebas mergulha no autoritarismo. Quando Polinice, filha travesti de Antígona, é assassinada, o tirano proíbe seu sepultamento com roupas femininas e a inscrição de seu nome verdadeiro. Inconformada, Antígona convoca uma reunião secreta entre todas as travestis e mulheres trans da cidade para derrubar o ditador e garantir à filha as honras que lhe são de direito. Um levante político e poético sobre memória, amor e resistência.
Serviço
Espetáculo: Antígona Travesti
Texto e direção: Renata Carvalho
Com: Renata Carvalho, Alice Guél, Andreas Mendes, Ave Terrena, Ayo Tupinambá, Daniela D’eon, Maria Lucas e Thays Villar
Duração: 60 minutos
Classificação indicativa: 16 anos
Período: 16 de outubro a 30 de novembro de 2025
Locais: Vila Maria Zélia, Teatro Taib, Casa 1, Teatro de Arena Eugênio Kusnet e Ocupação 9 de Julho Ingressos: R$80 (inteira) | R$40 (meia-entrada) | R$25 (ingresso amigo)
Reserva obrigatória: via WhatsApp – +55 (11) 94067-3441









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